22 de Março de 2011 às 10:31
Foto: Paulo Ribas/ Correio do Estado
Por Bruna Lucianer - Correio do Estado
Para beber
Juntos, os 766 mil habitantes de Campo Grande consomem, em média, 6 bilhões de litros de água por mês. Metade dessa água é proveniente de um único córrego, que atravessa o quilômetro 37 da BR-262, na saída para Três Lagoas. Estamos falando do Guariroba: córrego com tamanho e importância de rio que nasce em meio às fazendas do extremo leste do município, junta-se com o Córrego Botas e desagua no Rio Pardo, mais à frente.
Abastecendo Campo Grande desde março de 1987, o Guariroba já ganhava atenção especial num tempo em que preservação ambiental não estava exatamente em pauta. O poder público sabia da importância do manancial e estabelecia regras para que seu potencial fosse aproveitado com o mínimo de impacto possível.
Mas o fato de estar cercado por grandes propriedades rurais, dedicadas principalmente à pecuária, fez e faz o Guariroba enfrentar sérios problemas. A ação antrópica acentuada nas margens destruiu quase totalmente a mata ciliar e o pisoteio do gado “judiou” as nascentes dos córregos que formam o manancial.
“Se me perguntassem, há 10 anos, se eu achava que o Guariroba secaria um dia, eu diria que sim. Hoje a situação é outra e acredito que ele continuará fornecendo água para Campo Grande por muito tempo; talvez para sempre”, estima o engenheiro da Águas Guariroba, José Ailton Rodrigues. O que o fez mudar de ideia foram as ações em prol da recuperação e da preservação da Área de Proteção Ambiental (APA) de 36 mil hectares em que o córrego está inserido.
Representantes do poder público e do setor privado, inclusive donos de propriedades rurais localizadas dentro da APA, hoje trabalham juntos para que o local seja preservado. “Se essas ações continuarem sendo feitas, o Guariroba tem tudo para continuar sendo o principal abastecedor de água para Campo Grande por tempo indeterminado”, ressalta José Ailton.
A própria Águas Guariroba assumiu um papel importantíssimo nessa luta. Foi ela que recuperou a barragem em 2003, está reflorestando toda a área do entorno do lago – só nos últimos cinco anos foram plantadas 70 mil mudas de árvores nativas – e, o mais importante, mantém programas de economia e redução do desperdício, diminuindo significativamente a necessidade de captação de água do córrego.
Para admirar
Se você mora em Campo Grande, pare por um minuto e agradeça por habitar uma das cidades mais arborizadas do País e que, de quebra, oferece locais como os citados abaixo para "espairecer". Talvez você não se dê conta, mas isso faz uma diferença danada para a sua qualidade de vida. Guardados os problemas e as dificuldades históricas, os lagos da Capital merecem esta pequena homenagem.
Lago do Parque das Nações Indígenas
O lago artificial do Parque das Nações Indígenas foi construído com objetivos turísticos. Inaugurado em 1994, o Parque tornou-se um dos mais bonitos cartões-postais da cidade, ajudando inclusive a atrair investimentos comerciais e imobiliários à região leste da cidade.
O fundo de vale de outrora deu lugar a um complexo de lazer e recreação de 119 hectares, a poucos minutos do centro, e o pequeno banhado que ali existia foi transformado no grande lago de 43,3 mil metros quadrados. Lago este que recebe as águas de dois córregos: do famoso Prosa, que nasce dentro dos limites do Parque das Nações; e do anônimo Revelleau (lê-se Reveliô), que tem sua nascente nos arredores do Carandá Bosque.
Mas nem tudo são flores. A mesma urbanização que trouxe desenvolvimento para a região castiga o lago, acelerando o processo de assoreamento. A chuva traz lixo e sedimentos das partes altas recém-urbanizadas, como os novos condomínios do Parque dos Poderes, e tudo acaba depositado no fundo do lago.
De acordo com o assessor-administrativo do Parque, Odilon Rigo, em 2006 foi realizada uma força-tarefa de desassoreamento e foram retirados 6 mil metros quadrados de sedimentos do fundo do lago.
Hoje, o processo está de tal forma acelerado que Odilon estima que haja mais de 8 mil metros quadrados novamente depositados ali dentro. “Pretende-se realizar uma nova ação como a de 2006, mas antes é necessário resolver uma peleja judicial acerca da construção de outro lago, que servirá para segurar os sedimentos antes que eles cheguem aqui embaixo. Não adianta mexer no grande lago antes que essa ação preventiva esteja pronta”, explica Odilon.
Lago do Amor
Entre os estudantes da Universidade Federal, que adaptam o percurso só para ter a sensação de caminhar por alguns minutos às margens do lago, e os moradores das redondezas, que saem de casa e dirigem-se ao local pelo simples prazer de observar, o Lago do Amor possui seus admiradores.
Há relatos de que o local tenha sido escavado, na década de 60, para utilização da terra no projeto paisagístico da Universidade. O “buraco”, por onde passam os córregos Cabaça e Bandeira, teria então dado origem ao lago.
De acordo com o biólogo e professor da UFMS, Kenneth Roche, o lago possui 11 hectares de área e uma profundidade média de dois metros. São realizados monitoramentos da qualidade da água desde 1999, principal ação efetiva para preservação do local.
Ao contrário da Lagoa Itatiaia, o Lago do Amor oferece estrutura convidativa aos visitantes. Pista de caminhada, sombras de árvores, bancos e lixeiras espalhadas por toda a extensão da margem tornam o passeio agradável. Mesmo assim, é fácil encontrar lixo espalhado por todo o local; falta o bom senso, novamente.
Antenor Carvalho, de 45 anos, é vigilante bancário e aproveita as folgas vespertinas para trazer a sobrinha, Milena (na foto, à esquerda), de sete anos, para observar o lago. "Venho com ela pelo menos umas quatro vezes por semana. Ela gosta muito e eu aproveito a oportunidade ímpar de sentir a natureza por perto", relata.
O vigilante mora no Bairro Ipiranga, a poucas quadras do lago, e conta que, desde a revitalização do entorno, a residência valorizou cerca de R$ 90 mil. Mas, mais do que isso, ele valoriza o simples fato de ter um bonito local para "esvaziar a cabeça" tão perto de casa. "Se por algum motivo o lago sumisse, eu mudaria para Corumbá, Miranda. Faço questão de morar perto da água", declara.
Lagoa Itatiaia
Talvez um dos lugares que ofereça a melhor visão do pôr do sol policromático de Campo Grande, a Lagoa Itatiaia, localizada na região urbana do Bandeira, encanta pela beleza mas entristece pelo esquecimento. A grama alta em volta dos 9 hectares de água, a inexistência de qualquer coisa que se pareça com um banco para descanso e uma sacola plástica pendurada naquilo que deveria ser suporte para uma lixeira, denunciam o descaso com que o local é tratado.
O espaço é considerado livre de uso público e institucional e figura na lista das Áreas Especiais de Interesse Ambiental do Plano Diretor de Campo Grande. Há aproximadamente duas décadas, a região do entorno da lagoa era constituída por pequenas propriedades rurais, que foram sendo loteadas aos poucos, dando lugar a residências e aumentando significativamente a pressão antrópica sobre a lagoa.
Passou por uma fase nefasta, onde recebia indiscriminadamente entulhos e esgoto doméstico. Hoje, as garrafas plásticas e fraldas descartáveis abandonadas por ali caracterizam, ao mesmo tempo, a falta de bom senso da população e a falta de mínima estrutura para visitação. "Se colocassem algumas lixeiras, ficaria perfeito", analisa modestamente o produtor musical Alexandre Artioli (foto), de 29 anos, que nasceu por ali e diz ter tomado muito banho de lagoa na infância. Morando a duas quadras, ele passa por ali "sempre que dá", e lembra das vezes que voltou para casa carregado de garrafas PET que encontrou pelo caminho.
Alexandre presenciou várias fases pelas quais a lagoa passou e acha que hoje os problemas são bem menores do que na década passada. "A qualidade da água melhorou, sem dúvida. Mas a quantidade de lixo jogada nas margens é grande", retrata. Sem qualquer resquício de mata ciliar, garças, anhumas, quero-queros, tucanos, andorinhas e marrecos continuam sendo atraídos ao local. A resistência da natureza para deleite dos olhos
Fonte: Correio do Estado
Link: https://sindicario.com.br/noticias-gerais/agua-para-beber-e-para-admirar/