“As vozes daqueles que até aqui apoiaram o ‘consenso’ que levou o mundo à crise, voltam a entoar sua música enfadonha. São necessárias outras propostas, não aquelas que levaram à crise”
As seis centrais sindicais reconhecidas pelo Ministério do Trabalho - CGTB, CTB, CUT, Força Sindical, NCST e UGT - em iniciativa importante decidiram apresentar “documento unitário ao presidente Lula, à sociedade e aos trabalhadores” com objetivo de superar a crise financeira mundial, que começa a contaminar o setor produtivo nacional. O documento das centrais foi apresentado ao ministro do Trabalho, Carlos Lupi, e será apresentado também ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em reunião que acontecerá na próxima quarta-feira (26).
O documento contém dezoito pontos, em que as centrais expõem suas propostas, a fim de fazer frente à crise, manter os níveis de investimentos estatais, o emprego e a renda das famílias.
O texto destaca ainda as importantes iniciativas governamentais, em acordo com as centrais, que alavancaram o consumo interno e a renda dos trabalhadores na base da pirâmide social, como os sucessivos aumentos reais do salário mínimo, os programas de transferência de renda sintetizados pelo Bolsa Família, o fim das privatizações, o avanço do crédito em geral e do crédito consignado em particular.
O texto destaca também o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado pelo Governo Federal, em 22 de janeiro de 2006, que representou, segundo as centrais sindicais, “a consolidação da política de retomada do desenvolvimento, alavancado pelo Estado e com base no mercado interno”.
O documento chama a atenção para o fato de o PAC “já no seu primeiro ano, em 2007, o PIB teve uma expansão de 5,4% e foram criados 2,5 milhões de novos empregos com carteira assinada”.
Correto diagnóstico – As centrais - ao apresentarem as propostas para combater a crise, com a manutenção dos investimentos estatais e políticas públicas que garantam o emprego, a renda e o consumo interno - fazem uma crítica contundente ao modelo econômico que produziu a crise que ora solapa as economias mundiais baseadas no lucro como um fim em si mesmas e o setor produtivo dos países.
“O mito de que os ‘mecanismos de mercado’ são os mais eficientes para alocar os recursos econômicos das sociedades [desmancharam no ar, para usar uma expressão de Marx]. Trata-se, mesmo, do esfacelamento e do esgotamento de todo o aparato teórico-prático do que convencionamos chamar de ‘neoliberalismo’”.
E segue: “A imposição dos dogmas do livre-mercado e da auto-regulação gerou, na verdade, o ambiente propício ao ‘ganho fácil’ e à especulação das mega corporações multinacionais. A crise do modelo que ora desmorona impõe a necessidade de maior controle estatal e democrático da atividade econômica”.
Contrapartidas sociais – Com o objetivo de manter o emprego e a renda dos trabalhadores, as centrais apóiam as iniciativas governamentais emergenciais que procuram ajudar as empresas a preservar o caminho do crescimento e do desenvolvimento. Mas a ajuda do Governo às empresas precisam vir acompanhadas de contrapartidas sociais, que “visem a proteção dos trabalhadores e da população pobre”.
O documento denuncia o ainda “passa moloque” dos bancos, que estão “aplicando em títulos da dívida pública o dinheiro do compulsório liberado, invés de emprestá-lo ao setor produtivo”, conforme acordo entre o Governo e as instituições financeiras, a partir de decisão do Banco Central e do Ministério da Fazenda.
Leia as principais propostas das centrais contidas no documento:
1) implementar políticas econômicas anticíclicas, com base nos recursos públicos, objetivando não só manter o nível de emprego atual, mas também a sua ampliação;
2) manter e realizar os programas sociais e de investimento público que são fundamentais para contrabalançar a inevitável redução do investimento e do consumo privados. O Estado é a instituição decisiva para enfrentar a crise. As vozes daqueles que até aqui apoiaram o
“consenso” que levou o mundo à crise, voltam a entoar sua música enfadonha. São necessárias outras propostas, não aquelas que levaram à crise;
3) reduzir os juros em linha com o que vem ocorrendo no mundo inteiro. Como é possível desenvolver todo o potencial da economia brasileira com os mais altos juros reais do mundo?;
4) implantar um vigoroso programa de substituição de importações, para fortalecer o mercado interno e reduzir a vulnerabilidade da economia;
5) criar mecanismos de controle do fluxo de capital externo e de controle do câmbio. Segundo dados conservadores de 2007, cerca de US$ 268 bilhões podem deixar o país num processo de fuga de capitais expondo a relativa vulnerabilidade da economia brasileira;
6) todo e qualquer recurso público para ampliar a liquidez do sistema bancário e crédito aos setores produtivos deve ser acompanhado de contrapartidas sociais na aplicação dos mesmos, notadamente a preservação dos empregos;
7) os fundos sociais dos trabalhadores - FGTS e FAT - o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal podem e devem apoiar esse esforço de mobilizar os recursos públicos para combater a desaceleração da economia. Tanto em direção aos setores que devem ser apoiados, como para garantir as contrapartidas sociais. O investimento nas áreas de Habitação e Saneamento são bons exemplos de setores que geram emprego e reforçam a renda interna, já que os elos dessa cadeia produtiva estão instalados no Brasil, com efeitos positivos sobre a geração de emprego e renda, e sobre a qualidade de vida da população. Além disso, não pressionam a balança comercial e as importações. Políticas voltadas para apoiar o setor agrícola e a agricultura familiar reforçam a segurança alimentar e combatem a inflação, tornando-se fundamentais neste momento;
8) a democratização do Conselho Monetário Nacional, através de sua ampliação com participação de representantes dos trabalhadores e do setor produtivo, torna-se imprescindível para garantir maior equilíbrio na formulação e nas decisões das políticas monetárias do País;
9) redução do superávit primário com o objetivo de assegurar recursos para o gasto público e para o Plano de Aceleração do Crescimento, fortalecendo a política fiscal como instrumento de política econômica anticíclica;
10) ratificar e fazer cumprir, urgentemente, as Convenções 151 e 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT);
11) garantir a continuidade da política de valorização do salário mínimo negociada com as Centrais Sindicais, assegurando a aprovação do Projeto de Lei em tramitação no Congresso Nacional;
12) extinção do Fator Previdenciário, que penaliza o trabalhador no momento de sua aposentadoria;
13) ampliar as faixas de rendimento da tabela do imposto de renda e corrigir os seus valores anualmente para manter o poder aquisitivo dos trabalhadores;
14) assegurar o cumprimento da Agenda do Trabalho Decente, conforme compromisso assumido pelo governo;
15) promover a redução da jornada de trabalho, sem redução dos salários, como instrumento efetivo de criação de emprego;
16) promover a desoneração tributária de todos os produtos da cesta básica de consumo popular;
17) ampliar o número de parcelas do seguro desemprego, estendendo-o aos trabalhadores rurais contratados na modalidade do “plano safra”, e assegurando os recursos orçamentários para este fim; e
18) retirar todos os projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional que objetivem a flexibilização das relações de trabalho (PL 4.032/98, dentre outros).
Marcos Verlaine, do Diap