23 de Outubro de 2012 às 13:45

Diretor do BC diz que falta transparência na cobrança de tarifas dos bancos

BC

SHEILA D'AMORIM E VALDO CRUZ
FOLHA DE S.PAULO


Cinco anos depois de padronizar e limitar as tarifas que os bancos podem cobrar, o Banco Central agora está de olho nos valores dos serviços reunidos nos pacotes e disseminados entre os clientes.

Em entrevista à Folha, o chefe do Departamento de Normas do BC, Sérgio Odilon, explica que o objetivo é ver se há distorções entre os valores das tarifas divulgados pelos bancos e o cobrado de fato.

Os pacotes oferecidos pelas instituições, segundo ele, dificultaram a avaliação do resultado das mudanças promovidas pelo governo.

Ele afirma que não é objetivo tabelar ou intervir no mercado. Diz ainda que os clientes precisam tratar os bancos como qualquer outro estabelecimento comercial, reclamando se algo não foi satisfatório e denunciando vendas casadas. Odilon alerta, também, para as ofertas na hora da portabilidade.

Confira a entrevista:

Folha - Qual a avaliação da regulamentação das tarifas bancárias?

Sérgio Odilon - Antes de 2007, as regras eram muito pontuais. Os bancos eram livres para cobrar as tarifas que quisessem. No site do BC havia mais de 80 tarifas. Era algo impossível de comparar, seja pela quantidade ou porque cada banco chamava o mesmo serviço de nomes diferentes. Não havia padronização. Agora, há. E isso não há em nenhum lugar do mundo, somos pioneiros.

Hoje são quantas tarifas?

Nos serviços prioritários (90% das operações), o número de tarifas caiu de 80 para 19.

São quatro áreas: serviços essenciais, onde não há cobrança ou a cobrança é limitada, como no caso das folhas de cheque; serviços prioritários, o foco da padronização; serviços especiais, aqueles em que outra norma determina que pode haver cobrança, como a tarifa para avaliação de imóvel no crédito imobiliário; e serviços diferenciados, como aluguel de cofre.

O fato é que a receita de tarifa não vai pagar a conta dos bancos. 

As tarifas não estão elevadas?

O CET (Custo Efetivo Total), que criamos, é vital para o cliente checar o que é cobrado. Numa operação de crédito, a tarifa é um elemento. Há imposto e outros custos. Isso, traduzido ao ano, dá uma taxa de juro, que é o custo efetivo.

Por isso, na portabilidade orientamos para ter cuidado. O banco pode te atrair com taxa de juros menor, mas cobrar uma série de outras coisas. Pior: em outros, serviços pode cobrar uma taxa de administração muito maior num fundo de investimento, remunerar menos num CDB, e você acaba perdendo. Faça a conta. O cliente tem que fazer a conta, ele é o dono do dinheiro.

Os bancos divulgam o CET?

Os clientes podem e devem cobrar e não esperar que os bancos saiam anunciando, porque isso eles não vão fazer. O que esperamos é que o cliente tenha ciência do instrumental que existe, que é gigantesco e referência no mundo, e use.

Mas os bancos não são obrigados a divulgar o CET?

Todos divulgam? Acho que não. Por que a dificuldade? Porque tem uma rede gigantesca de agentes. Se a pessoa pedir, ele é obrigado a dar. Se negar, tem que fazer reclamação na ouvidoria do banco, vir ao BC.

Temos convicção que só por meio da transparência e do estímulo à concorrência é que se pode fazer com que os preços caiam e os serviços sejam mais justamente cobrados. E quem faz esse papel? A norma? Não. A norma é o veículo, quem faz esse papel é o cidadão.

Está descartada qualquer intervenção para definição de tarifas?

Essa não é a filosofia que norteia o nosso trabalho. Estamos num sistema de livre iniciativa. Não temos a pretensão de fazê-lo. Não conhecemos o negócio de cada banco. São 2.500 instituições diferentes, e cada uma tem um custo. Não sou eu que vou determinar isso. É o cliente. É devagar? É, ele precisa comparar.

Mas isso está ocorrendo?

Temos uma tabela com os cinco serviços básicos --cheque, saque, extrato, transferência e cadastro-- que respondem por 90% dos serviços utilizados. Os bancos declaram o que cobram ao BC e colocam no site deles. Onde está o detalhe difícil de pegar? Pacote. O banco, em vez de cobrar tarifa por tarifa, oferece um pacote por mês. Teoricamente, o pacote é mais barato. Mas são milhões e não dá para colocar no site.

Não queremos mexer no negócio bancário. É o banco que tem condição de negociar. Mas o cliente tem de ver se o pacote oferecido é o que ele usa. Faça a conta, não é tão difícil.

Os bancos fazem vendas casadas. É preciso fazer cartão de crédito ou transferir sua conta para ter crédito imobiliário.

Pode denunciar [isso]. É inconstitucional. Isso afronta o Código de Defesa do Consumidor, e o banco não pode fazer.

Não é fácil resolver. O cliente está numa ansiedade imensa [para obter o crédito imobiliário]. Ele não vai procurar outro banco. É como na compra de automóvel, a pessoa sente o cheiro de carro novo, se anima e cai no conto... Banco não é diferente dos outros agentes econômicos.

O cliente precisa ter com o banco a mesma relação que tem com outra atividade comercial. Se você compra uma camisa, chega em casa e ela está furada, você volta para trocar na hora.

Com o banco não dá...

Com o banco o cliente não volta. Por isso, criamos a portabilidade e a regra de ouvidoria. Tem que reclamar com quem lhe presta serviço. O banco tem que dar um protocolo e um prazo para responder. Com esse protocolo que você reclamou, venha ao BC.

Onde está comprovado que a padronização estimulou a concorrência?

De cinco anos para cá, tivemos mais 40 milhões de clientes, a nova classe média. Entrou muita gente no mercado e aumentou a receita de banco. Tem que ponderar banco a banco. Temos isso. São estudos internos. Talvez o BC não fique muito confortável [em divulgar] porque são duas coisas: o valor declarado e o efetivo.

O banco diz uma coisa e cobra outra?

Pode ter um bancão que está entre os dez maiores e não se preocupa com tarifa porque o cliente dele é de outro nível (só tem pessoa jurídica ou milionários). Aí ele declara qualquer valor [de tarifa] e isso distorce toda a base.

Estamos trabalhando muito para tentar depurar e mostrar o impacto efetivo em cada uma das tarifas do sistema financeiro. Do declarado para o efetivo, [a diferença] é monumental. Os maiores interessados deveriam ser os próprio bancos. Se o efetivo, que é o pacote, é mais barato, eles deveriam estar falando. Mas não se tem essa informação.

Os bancos encontraram formas de driblar a regra?

Como modelo, achamos que [a regra atual] é perfeita. Temos que apurar melhor os pacotes. Não queremos impedi-los. Isso prejudicaria o consumidor. Mas como consigo obter melhores informações? O objetivo maior da regra não foi baixar tarifa. Foi corrigir a assimetria de informações e dar mais transparência. A derivada é a redução das tarifas.

Mas o modelo tem falhas?

Cinco anos depois, avaliamos que o modelo é perfeito. Ele estimulou a concorrência, permite a comparação e nenhuma tarifa nova que nos foi trazida para criar achamos que foi justificada. Tentamos agora entender quanto de fato está sendo cobrado por meio de pacote. Queremos entender os pacotes e melhorar a qualidade de estatísticas das tarifas.Fonte: Folha de S.Paulo

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